Álbuns Clássicos - For Thouse About Rock We Salute You (AC/DC)

Em 1984 as coisas não estavam fáceis na minha casa. Meu pai, vitimado por suas ideias políticas, marcado por ser linha de frente na grande greve do final dos anos 70 nunca mais arrumou emprego e começava ainda a se acertar e tentar dar um novo rumo para a vida da gente mas as coisas não estavam fáceis.

Com 13 para 14 anos, assistia meu pai procurando trampo e minha mãe, que havia parado de trabalhar em 1974, não se fez de rogada. Arrumou três casas em Santo André e caiu para fazer faxina como diarista e assim, passou a ajudar nas contas e diminuir um pouco da dureza. Meu velho assistia a tudo com uma grande tristeza...

Não gostava de ver sua mulher ralando daquela forma pra ajudar em casa. Não havia casado para aquilo acontecer. Minha mãe sempre fez de boa mas ele não gostava. Meu velho, homem culto, bem educado muito inteligente, sentia-se triste com tudo. Eu, posso dizer que talvez
tenha faltado um bife, um melhor tempero no feijão... Mas na minha vida nunca faltou um livro pra ler, um rádio pra ouvir um som. Só que a época era de muita dificuldade.

Era começo de Outubro de 1984 e meu aniversário, dia 05 daquele mês se aproximava. Como eu já tava ligeiro da vida, já imaginava que não haveria bolo, festa e fogos para o meu aniversário. Lembro-me que no dia, passei a mão numa fita cassete, que meu primo havia gravado do AC/DC e durante o dia, passei ouvindo HIGHWAY TO HELL e dançando com minha irmã, Melissa. Para mim já tava ótimo.


No entanto eu estranhei ao achar uma caneta e uma folha de papel ao lado das minhas coisas que eu não havia levado até lá. Enfim... Passou o dia. Deu então 19:30h da noite e ouvi no portão a chegada de minha mãe na labuta.

Naquele dia, minha mãe trazia uma sacola de roupas de trabalho, um pacote de pão, a carne pra eu e minha irmã jantarmos e um estranho embrulho que ela me deu assim que entrou na cozinha. Um pacote escrito “Discoteca Aldo”

“O fio, veja aí se comprei certo...”

Abri com pressa e quando me livrei do pacote estava lá... “AC/DC, disco FOR THOUSE ABOUT TO ROCK... WE SALUTE YOU”. Cara... Uma senhora, semi-alfabetizada, que nunca falou uma letra em inglês, não sabe absolutamente nada do mundo do rock, que passou o dia todo entre desinfetante, rodo, água, ferro de passar roupa... Um dia antes, pegou um papel e anotou de um pôster meu o nome do raio da banda, descambou pro centro de Santo André mesmo cansada, e me comprou um disco de presente de aniversário. Pois é...

Esse não é o melhor disco do AC/DC. Talvez não seja o meu predileto dentre o mundão maravilhoso dos três acordes mas, com certeza é o mais importante da minha vida. Devo a ele tudo que sou, tudo que sei, tudo que descobri e tudo que vou descobrir na minha vida. Aquele gesto de minha mãe, simplesmente definiu o caráter de um garoto porque ali, com a grana ganha em uma diária, minha mãe me deu um disco e me ensinou como era ter amor por alguma coisa, no caso, a música.

Por tudo isso fica aqui esse Álbuns Clássicos dedicado a maior mulher que eu conheci na minha vida. E apesar da gota de lagrima que me escorre a barba e pinga aqui em cima da tecla “V” do teclado, é com um enorme prazer que escrevo o que vou escrever ae embaixo:

Obrigado, Mãe!

Marcelo Mendez é colaborador do Pastilhas Coloridas, filho da Dona Claudete, escritor e um dos responsáveis pelo cineblog Bandidos do Cine Xangai.
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