Por trás da tela - Ser Humano

Por Bruno Módolo 

Ser ou não ser... humano, eis a questão.
As pessoas agem por motivos que muitas vezes não entendemos. Assassinos, maldosos, os bondosos também, mulheres, homens. Todo mundo faz coisas e só depois de conhecer melhor a personalidade é que vamos entender porque fizeram o que fizeram. O que antes parecia estranho, passa a fazer sentido. O ser humano tem suas motivações e nem sempre, ou melhor, quase nunca elas são claras e palpáveis como um objeto material. Motivação é emoção e emoção não se vê.

É assim também com os personagens. Cada um deles tem que ter suas motivações para que, principalmente, o público tenha empatia. E sem motivação, o personagem fica frouxo, sem sentido. O personagem precisa agir, precisa fazer alguma coisa, querer alguma coisa, nem que essa coisa seja lutar contra todos para não mudar seu jeito acomodado de ser.

Mas há um outro problema além de um personagem sem motivação, e que deixa os personagens ainda mais frouxos. É quando sua motivação é mal explicada. O ser humano não se explica, ele simplesmente acontece. Gostamos de música sem entender porque, achamos alguém bonito por coisas que ninguém mais vê, nos apaixonamos por uma profissão que aos olhos dos outros parece ridícula. Mas é assim que somos. E como explicar isso? Por meio do nosso comportamento e nossa personalidade.

Fazer com que o público entenda um personagem pela personalidade e pelo comportamento é muito difícil. As vezes chega a ser impossível. Então, entra em ação algo que estraga um filme que poderia ser brilhante: o material.

Dar uma razão palpável para as motivações de um personagem é quase uma ofensa. O filme O Plano Perfeito, escrito por Russell Gewirtz e dirigido por Spike Lee peca por isso. O personagem Dalton Russell, vivido por Clive Owen, arma um esquema perfeito para assaltar um banco. O filme segue muito bem até o final, quando a motivação do bandido é explicada. Uma suposta vingança moral para contra o dono do banco, que enriqueceu fazendo acordos com os Nazistas durante a Segunda Guerra. Francamente, não precisava disso. Dalton Russell não queria enriquecer, queria ser um vingador, um fanfarrão que brinca com os poderosos. Então que fosse um verdadeiro fanfarrão, fazendo coisas de ser humano, sem ter que explicar. 
Com medo do público não entender o personagem, criou-se algo material para que o objetivo da ação ficasse clara. Mas de tão clara que ficou, temos a sensação de que não é um ser humano que está lá e sim uma marionete ligada às mãos do diretor do filme.

Esse é só um exemplo entre muitos filmes que fazem isso: acham uma razão palpável para as motivações invisíveis do ser humano. Nós também cometemos esse erro na vida real, quando criamos rótulos ou modas para justificar as coisas. Curtimos tal boteco porque está na moda, tal tipo de comida porque todo mundo está comentando, tal música, tal roupa, tal destino turístico. Não precisa justificar as atitudes e vontades desse jeito.

Está faltando ser mais humano na vida. Querer as coisas sendo sinceros com nossos desejos e comportamentos. Está faltando fazer filmes com olhos para a emoção, para os atores interpretarem personagens que sejam seres humanos de verdade.

Bruno R. Módolo é roteirista e sócio da Garoa Fina, um estúdio dedicado ao desenvolvimento de roteiros e histórias para TV, Cinema e Publicidade. faledoartigo@garoafina.com.br
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