É quase que impossível negar que a língua do Rock and Roll é o inglês. Foi assim que ele foi concebido, e inevitavelmente a coisa desce bem mais fácil na maioria dos casos. Alguns dizem até que rock em outra língua é como Samba em japonês. Eu discordo.
O Rock and Roll que viaja pelo mundo até hoje é cantado em inglês, mas desde a sua explosão no final dos anos 50, o ritmo ganhava novos contornos nos países por onde passava. Até na Inglaterra, cujo idioma é o mesmo dos criadores, o Rock and Roll incorporou elementos da cultura local, o Trad Jazz por exemplo, vertente do jazz muito popular no Reino Unido durante a década de 50 é um desses.
Outra coisa: distante das tensões raciais que pautavam os primórdios do ritmo nos Estados Unidos, os Rockers ingleses agregavam mais e mais elementos de Blues e Soul em suas composições, ganhando particularidades que cada vez mais os diferenciavam dos norte americanos. Particularidades essas que geraram muitas discussões ao longo desses anos: Rock Americano ou Rock Inglês, eis a questão! Enfim, isso é uma outra e longa conversa...
E assim foi, por onde passava o Rock and Roll assumia uma nova identidade perante a cultura local de cada país. A proliferação do ritmo, na minha visão, foi dada justamente por essa “fácil” modelagem que recebia aonde chegava. Até em lugares cujo idioma não era dos mais agradáveis para ouvidos alheios, caso de Indonésia e Malásia, e sem contar o nosso querido Japão - onde o ritmo teve forte impacto entre os jovens no começo dos anos 60- adaptaram o Rock and Roll a sua língua nativa.
No Brasil o Rock deu as caras na voz de uma cantora de samba-canção (ai!), Nora Ney, que gravou "Rock around the Clock”, em inglês, do Bill Haley em 1955. Só em 1957 o ritmo ganhou “versão brasileira” na voz de Cauby Peixoto (outro pára-quedista) que gravou “Rock and Roll em Copacabana”. Daí vieram depois: Tony e Cely Campello, Roberto e Erasmo, a Jovem Guarda, Gil e Caetano, os Mutantes e o Rock ganhou voz, sotaque e “groove” em versão nacional.
Nos anos 80 o chamado “Rock Brasileiro” ganhou definitivamente o espaço – “pero no mucho” mais hoje em dia - nas grandes vitrines da música produzida no país. Rock cantado em português de Salvador, de Porto Alegre, de São Paulo, do Rio, de Minas e por aí vai. Boas letras ou nem tão boas ou péssimas mesmo, não importava, o Rock era nosso de vez!
Já com o português nosso de cada dia bem adaptado no final da década 80, o “Rock Brasileiro” sofreu um duro “golpe”. Alguns “engraçadinhos” começam a adotar o inglês como idioma nas suas músicas, “no nosso” Rock. “Aí não!” dizia o coro de meia dúzia de “críticos musicais” filhos bastardos do Renato Russo.
Não que isso já não tenha sido feito pelos Mutantes lá em mil novecentos e guaraná de rolha, mas me parece que o impacto de uma democracia recém constituída e um nacionalismo “universitário” infanto-juvenil daquele final de década, fez de uma simples opção artística um caso de “violação do patrimônio nacional”.
Engraçado que isso bate na mesma linha de raciocínio que, lá nos anos 60 fez um bando de “universitários” (ô raça!) metidos à comunas organizassem uma passeata contra a guitarra elétrica na música brasileira, e de também vaiarem o mano Caê e os Beat Boys no festival de 67. Ditadura na Ditadura!
Voltando ao final dos 80, uma das bandas que deram corda nesse imbróglio patriótico dentro do Rock Nacional foi formada aqui no ABC Paulista, mais precisamente em Santo André: os Pin Ups.
Totalmente a contramão do mercado da época e mais radicais que os gaúchos do De Falla, que mesclavam composições em português e inglês, a banda do Zé Antonio - diretor da MTV desde os anos 90 - não queria nem saber de “sexo verbal não faz meu estilo...”, e além disso, foram precursores das chamadas “Guitar Bands” aqui no Brasil.
Nos anos 90 o “efeito Sepultura” mudou a mentalidade, não só dos chatongos diretores de gravadoras e de rádios, mas também da molecada que rabiscava as primeiras linhas e acordes nas garagens. Sonhando em repetir a proeza da banda mineira e conquistar o mundo do Rock ou o mundo com o Rock, o inglês virou quase que obrigatório quando se pensava em montar uma banda.
Nessa época cansei de ler entrevistas de nêgo justificando a opção pela língua mãe do Rock, que era mais fácil compor em inglês por causa da sonoridade da língua e blá blá blá. Eu digo só uma coisa: não é fácil compor em nenhuma língua, seja ela qual for. Se o cabra for ruim, não tem o que dê jeito.
Várias bandas nesse começo de anos 90 optaram pelo inglês, algumas por convicção, como os nossos heróis do Pin Ups, e outras por puro embalo mesmo. Algumas poucas fizeram história, casos de Killing Chainsaw, Mickey Junkies, Second Come e Garage Fuzz. Muitas outras não fizeram foi porra nenhuma...
Hoje, isso já não tem tanta relevância assim, creio eu, claro que o nosso mercado absorve muito mais as bandas que utilizam o português, mas daí aparece um “Cansei de ser Sexy” e funde a cabeça da molecada outra vez.
Uma coisa é certa: não caía em catequização furada e fuja das "formulas” e das “modinhas” do esquemão. Independentemente da língua, muita coisa produzida aqui, em inglês e principalmente em português, é boa. Basta ater-se ao que realmente interessa: a música.
