De Holden Caufield a Paulo Henrique ganso ou o lado selvagem das chuteiras imortais.

Por Marcelo Mendez

Em meio a um sábado espetacular passado com os amigos e um domingo em que troquei versos em miúdos com tão nobre dama (Quem é do sereno ou quem lê John Keats que vai entender...) eis que venho para falar da ludopédia nossa de toda segunda aqui em Canela de Ferro. Confesso que não sei se com grande entusiasmo de sempre afinal tal sentimento contrário a este é muito compreensível nesse começo de ano, de temporada, diante do que se apresenta a nós que gostamos dessa coisa mágica que é o futebol.

Ta tudo indicando para o mais do mesmo.

São milhares de jogos em Campeonatos Regionais que de nada valem, regulamentos esdrúxulos em fórmulas de disputa rocambolesca, times em formação e a coisa sempre caminhando para um marasmo de fazer inveja a Holden Caufield no tão espetacular livro O APANHADOR NO CAMPO DE CENTEIO do não menos espetacular J.D Salinger.

De todos os jogos que de pouca coisa servem, um clássico me chamou atenção. Santos x São Paulo em Vila Belmiro tem atrativos que me interessam demais. Mas dessa vez não são os dribles a lá Douglas Fairbanks de Neymar, não é a dignidade Nordestina do sério Durval, não é o campo do sonhos que remete a Vila Belmiro. Dessa vez, tal e qual um bom filme Hitchcokiano reforçado de Tipp Headen, quem me interessa é um antagonista:

Paulo Henrique Ganso...

Ganso é para mim um craque renascentista. De seus pés vem à primazia dos Semi-Deuses que tem a capacidade de controlar o tempo e as coisas do mundo. O camisa 8 do São Paulo, toca a bola, da mesma forma que Paul Desmond tocava sua palheta para frasear Take Five ao lado de Dave Brubeck. Consegue dar ônus de imortalidade em um simples toque na bola. Com ele, um calcanhar é maior que toda a obra de Lonescu. Ganso jogando futebol é de uma grandiosidade épica, capaz de transformar Sheakspeare em uma reles chanchada da Atlântida. Ae então ele jogaria pela primeira vez contra seu ex-clube, o Santos, em plena Vila Belmiro. A respeito disso muitas coisas foram ditas.

Falou-se que o Craque não queria mais jogar futebol. Que estava preguiçoso, que tinha problemas em sua vida pessoal, que sua carreira era mal gerida pelos seus, que fez escolhas erradas, que não seguiu um caminho linear, que o Tabule da Dona Ercilia não tinha folha de uva e mais um monte de coisas. Ta...

Em instante algum no meio de todas essa falácias, parou-se para pensar no Craque. Na essência pura e plena que faz um sujeito passar da reles condição de mortal, para um semi-deus que rege essa condição ludopédica. Oras caro leitor. Craques são Gênios. Não vão mesmo seguir essa tal “linearidade” careta dos estetas da autoajuda e do New Marketing. Não vão mesmo caminhar pelas óbvias retas do agrado coletivo tolo, não tomarão decisões que eu, ou você tomaria em prol da segurança do burguesismo previsível e chato.

Assim como o Gênio, o Craque beija a boca de Deus. Mas o faz em uma esquina improvável da noite fria ao som de Tom Waits.

Ganso, portanto não tem comigo o peso de ser comum. Ele não tem que me agradar pela obviedade. De seus pés eu não quero ver um “passe que decida”. Minha função como jornalista, como cronista não é procurar por isso, não tenho compromisso com as “metas” que engessam a poesia. Eu quero do Craque o ludismo. Eu quero dele seu sorriso, sua paz, sua alegria, um pouquinho de seu encanto vez por outra. Ao contrario disso a Resenha futeboleira é tão somente burra.

Se diz a boca larga nos programas futeboleiros; “Ganso precisa se adaptar a forma do São Paulo jogar...” ou “No 4-2-3-1 do Ney Franco, precisa ter uma movimentação da parte de Ganso para o time andar. No futebol moderno não da para jogar dessa forma clássica que ele joga”.

Minha nossa!

Então no tal “Modernismo” desse mundo careta, chato e previsível, o problema é a beleza? O grande entrave dos novos tempos é a Elegância Clássica de um rapaz de 20 e poucos anos que se recusa peremptoriamente a ser mais um qualquer, para manter sua condição de Dândi de chuteiras?? O que queremos, nós, torcedores, Jornalistas? Cronistas, mães zelosas e moças sérias de família?

Queremos um Craque, ou um Contínuo de repartição pública programado pra dizer “sim”? Vamos então matar o encanto, a contra-mola que resiste ao tédio, para agradar os Cretinos fundamentais? Ah vá...

Eu quero que se dane os resultados! As favas com os números frios! Eu quero do futebol o que o um menino virgem quer diante da Charlize Theron pelada! Porque sem paixão, eu não chupo um picolé!! De que importa falar aqui que o jogo acabou 3x1 para o Santos? Você que ta me lendo ae, depois de horas de “gols da rodada” quer mesmo saber disso? Pois bem.

Eu vou aqui dizer que a grande imagem desse fim de semana foi o abraço de Neymar em Paulo Henrique Ganso antes de começar o jogo. Quero aqui dizer a ti Ganso, que como Craque, nessa nossa relação aqui Cronista/Craque tu pode tudo! Você sempre estará certo. Então Paulo Henrique Ganso, por favor:

Me respeite com o seu mais profundo desrespeito...

Marcelo Mendez é colaborador do Pastilhas Coloridas, filho da Dona Claudete, escritor e um dos responsáveis pelo cineblog Bandidos do Cine Xangai.
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