Por Marcelo Mendez
A primeira vez que vi Rosângela Dias na redação do ABCD Maior, fiquei intrigado.

Quem a vê chegando para trabalhar, agarrada ao livro que sempre a acompanha junto ao seu peito pensa; “Menina meiga, lembra uma normalista”. Eu até pensei nisso. Mas quando eu conversei com ela a primeira vez logo tive repelida tal imagem. Eu fuçava no computador estupidamente, de maneira atabalhoada quando ela me me viu e falou resoluta:
“Precisa de senha. Espera que daqui a pouco te arrumam uma e então você liga”
Força! A pequena menina bonita me falou aquilo com a firmeza de Lee Van Cleef! Com a decisão de Romário diante do goleiro uruguaio no maracanã... Costa Gravas adoraria vê-la em ação naquele momento. Eu também gostei! Passei a observa-la...
De óculos de aros leves, com o pescoço delicadamente inclinado para trás diante da tela de seu computador, a menina transbordava encanto. Suspirava três vezes sutilmente quando o parágrafo lido chamava sua atenção e ae, imaginava ela ouvindo Regina Spektor. Até o dia que ela me disse em uma tarde fria:
“Só o Motorhead salva, Marcelo”
Concluí então que Rosângela é encantadora por conta disso tudo, do contrário que bem que pode acontecer ou seja; Do exercício de enxergar o que não é explicito, do que não é óbvio. Para assuntos ludopédicos isso é fundamental. Vejam o caso de Paulo Henrique Ganso e sua transferência do Santos, para o São Paulo. Caro leitor...
Paulo Henrique Ganso é o Rudolf Nureiev do Futebol.
Um jogador que transita entre os grandes craques do passado e ao que há de mais moderno na forma de entender o jogo de bola. Em tempos de um futebol que me parece apressado e sem cérebro, Ganso joga com uma leveza de um Didi, de um Aírton Lira, um Zidane pensando de maneira rápida e pratica, que permite com que ele execute tudo que imagina com rara maestria. Ganso é a prova que esse embate entre “novo e arcaico”
é uma estupidez. Ele prova que é perfeitamente possível o dialogo entre as duas partes. Mais que isso, é necessário que haja esse dialogo em prol de um futebol de fato, belo. Mas ae vem a cretinagem fundamental óbvia, da sanha das pobres redações por uma meta que justifique a lauda burocrática do repórter que não sabe nada de bola e nem da vida:
“Ganso não conseguiu jogar nada nesses últimos meses” - Ta. Mas porque isso aconteceu? Porque será que o craque, o gênio, o jogador que está acima da média, que não pisa a mesma grama de um Ralf mortal não estava jogando bem? Porque haveria o craque de nobre estirpe, estar de saco cheio de tanto “futebolês” de treinador tosco, de falácias ludopédicas, de concentrações e de mesmices??
Caro leitor a cabeça de um sujeito genial perambula por cantos diferentes dos nossos... Nós que somos pobres pagadores de contas de luz ao término do mês. O Craque não. Não habita nosso mundinho de pobreza de alegria, de falta de encanto, de ausência plena de poesia, de festa e de fúria santa! Para Ganso esse troço de gol é uma bobagem, uma coisa muito comum e previsível, qualquer um pode fazer. Agora, um
passe imortal, uma rosca na bola após uma batida que beira a divindade ae não... Isso não é comum.
Ganso me lembra Rosangela Dias pelo que há de mais improvável no comportamento nosso de cada dia. Na beleza do inesperado. Um dia pensei como seria se a pequena bela menina do caderno de Cidades do ABCD Maior fosse uma boneca, uma boneca de pano...
Ao contrario daquelas porcarias de PVC, falsas, xexelentas e perfumadas, a menina Rosangela teria um outro encanto; Haveria dias em que ela tanto poderia ser de pano quanto de pedra. Poderia rir num minuto e chorar no outro. Sair da mais profunda tristeza a mais “irritante” alegria em questão de segundos. Odiaria com a mesma
intensidade que ama. Acaricia e bate com a mesma suavidade. Poderia rir num minuto e chorar no outro. Sair da mais profunda tristeza a mais “irritante” alegria em questão de segundos. Acariciaria e bateria com a mesma suavidade. Sufocaria-se com o “alívio”. e se divertiria com o tipo estranho que divide o mesmo ônibus que ela. E todo esse conjunto de paradoxos faria dela algo extremamente apaixonante como de
fato ela é.
Mas o que aconteceria se eu desistisse de enxergar isso tudo logo no primeiro contato que tive com a menina?? Eu perderia absolutamente toda essa riqueza de pessoa. O mesmo se dá com Ganso....
Se nós, apreciadores de tão nobre arte ludopédica tivermos paciência do coração hippie de Rodrigo Pinto, de monge tibetano com as estupidezes de um Mano Menezes, com os passes tortos dos volantes de punhos fechados que habitam nosso futebol e não conseguirmos esperar florescer a primavera de um craque como Paulo Henrique Ganso, nada mais poderá ser feito. Se pensarmos assim melhor entregar de vez o esporte aos estetas da autoajuda, do mídia training e de outras falácias. Mas caso os amigos que me leem agora aceitem meu convite de embarcar na nau da magia e da alegria inevitável, podem chegar. Serão bem vindos. Aos que não quiserem, sugiro que deem um pulo na redação do ABCD Maior para conhecerem os encantos da Rosangela, da minha
boneca de pano. Mas cuidado:
Não esperem ouvir dela aquelas musiquinhas idiotas de outras bonecas metidas a besta. A minha boneca dança ao som do silencio e dorme com Lou Reed berrando na luta para nina-la por algumas horas. Ganso é assim, Rosangela é assim.
Walking On The Wild Side, Rosangela, Keep Walking...
Marcelo Mendez é colaborador do Pastilhas Coloridas, filho da Dona Claudete, escritor e um dos responsáveis pelo cineblog Bandidos do Cine Xangai.