Os 5 discos gringos que mais ouvi em 2012

Por Ana Mesquita | 

A lista abaixo não pretende ser um rank, são somente minhas impressões pessoais sobre os discos gringos lançados neste que mais ouvi ao longo de meus dias. É também uma tentativa de remissão, pois estive ausente por demais das páginas do Pastilhas.

Enjoy!

The Cherry Thing – Neneh Cherry and The Thing

Uma das parcerias mais inusitadas que já vi na vida resultou no melhor disco do ano. O pouco que me lembro do som da Neneh Cherry não me agrada, já não posso dizer o mesmo do The Thing, pois free jazz e punk rock me agradam demais da conta. Até o lançamento deste disco acreditava que a única coisa que poderia ligar Neneh e The Thing era a nacionalidade sueca de ambos, bem como a admiração do grupo de free jazz pela obra do pai da moça. Por isso a surpresa – e isso sempre é um elemento que levo muito em consideração na hora de passar a gostar de um som – quando ouvi esse disco. É um disco de meio-termo, e apesar de não gostar muito do “mais ou menos” ou o “pela metade”, esses termos aqui não se aplicam.

Nunca curti o som da Neneh, e o som do The Thing atinge somente um nicho de mercado, não é fácil de ser digerido. The Cherry Thing pôde trazer elementos sonoros sofisticados para a deliciosa voz de Neneh, e ao mesmo tempo propiciou que um público que habitualmente não se aproxima do free jazz ter uma vislumbre de como esse gênero pode se fundir com outros estilos. Neneh ganhou estilo e força, The Thing pode circular por novos públicos. Um empate onde todos ganham.

O repertório escolhido é fascinante, destaque para a versão Too Tough to Die, de Martina Topley Bird, cantora singular da qual sou muito fã, já Sudden Moment é a mais bela melodia do disco, o caminho melódico da voz de Neneh e do sax de Mats embriaga os sentidos, eleva o espirito. O ponto alto é a versão de Dirt do The Stooges, música que tem tudo a ver com o promissor projeto. Esperamos ansiosos que a parceria dê mais frutos.


Lonerism – Tame Impala

A música “Led Zepellin” entrou como um furacão em minha alma. Peguei o link no sempre ótimo Trabalho Sujo, do Alexandre Matias. Fui caçar e descubro que o Tame Impala veio pro Brasil fazer um show incrível – dizem – no Cine Joia. Eu até lembro-me de ver algo relacionado ao grupo nos blogs de música, mas confesso que não me dei ao trabalho de ouvir a banda. Bem, apesar do show perdido, fui atrás daquela banda que soa parecido com várias coisas que eu gosto, e que eu não gosto também (aqui uma observação: nunca gostei de Led Zeppelin, meu caminho na música sempre foi mais pelo lado do barulho do que pelo do rock com influências bluzeiras, só muito recentemente fui entender o que era Rolling Stones e, como quase tudo em minha vida, a partir de conversa, explicações e audições com os amigos para que aquilo fizesse sentido, a verdade é que nunca tive um amigo que se dispusesse a me explicar sobre Led Zepellin), mas que tudo junto dá um caldo delícia.

Lonerism chegou ao mercado no começo de outubro e pelo que pude perceber muito aguardado pelos fãs e crítica. O show que os garotos – uns moleques! – fizeram no

Lollapalooza de Chicago estava lotadaço, apesar de terem tocado no meio da tarde. Dizem também que os shows no Brasil arrebentaram. Rock psicodélico, guitarra altas, Beatles, Cream... tudo soa como o rock setentistas, mas tem um pegada atual, com música pop, eletrônica, teclados.

A grande verdade é que o Tame Impala, apesar de sair em turnê e existir fisicamente como uma banda de fato, é uma banda de um homem só, no caso o australiano Kevin Parker deapenas 26 anos. É ele que compõe, toca e grava praticamente tudo em Lonerism, em seu estúdio em Perth – capital da Austrália Ocidental. Canções como Endors Toi e Keep on Lying me deixam num estado de felicidade desgraçado, principalmente quando você se dá conta que a maior parte das músicas do rapaz versa sobre solidão. Ouvir Mind Mischief nos fonesde ouvido, dando um role pela cidade, faz qualquer viagem de trem parecer surreal. Em entrevista à uma publicação inglesa perguntaram ao chapado - só pode ser - Kevin qual aprincipal diferença entre o Innerspeaker (incrivelmente genial primeiro disco do Tame) e o Lonerism e, segundo a revista, ele respondeu mais ou menos assim “First he suggested Lonerism contained "melodies that beam at you rather than wash over you". Then he reconsidered, suggesting instead that its songs were "more like an explosion rather than a wave". And then he decided the new songs were quite like a wave after all: "Like waves that hit you rather than you swimming in an ocean of melody," he offered, adding a hopeful "know what I mean?"”

Tente traduzir a sinestesia agora.





Shields – Grizzly Bear

Um dos discos que mais ouvi neste ano, Shields me fez companhia nas idas de trem pra Mauá e também nas longas esperas geladas pelo 154 no Terminal Sacomã (que possui um microclima próprio), as canções dolorosas me botavam no chão: a pesar da vida ir muito bem obrigado, nunca se esqueça de toda a dor que pode conter dentro de alguém. Apesar desse álbum ter mais teclados e piano e menos guitarra do que o disco anterior - Veckatimest - os elementos que me fizeram se apaixonar pela banda continuam lá: melodias belíssimas, ecos, e letras que falam de perda, solidão e desilusão. The Hunt provavelmente é a música mais triste que eu ouvi neste ano, a voz de Edward Droste carrega de significado cada palavra dita na canção, música pra escutar debaixo do edredom num dia cinzento, de preferência chapado de vinho, na real eu ouvia indo pro Jardim Zaíra. “A Simple Answer” é a minha música preferida, diz a lenda que ano que vem os rapazes farão show no Brasil, estarei esperando ansiosamente.



Between the Times and the Tides – Lee Ranaldo

Fiquei tão apaixonada por esse disco que até esqueci que o Thurston Moore tinha lançado também um disco solo uns tempos antes. Também, é o disco do meu integrante preferido da banda que mais gosto no mundo inteiro. Pra quem gosta de Sonic Youth é um belo drink a ser consumido sem moderação, apesar de ter saído no primeiro semestre, ainda continuo ouvindo quase todos os dias. A balada Hammer Blows traz Lee ao violão, tocando com e para a alma, mas o que mais me chama a atenção nesse disco é sua urbanidade. É incrível como faz sentido – e essa característica sempre esteve presente na obra solo de Lee, bem como de suas canções no Sonic – que sua música remeta a uma experiência de vida específica num ambiente, ou seja, a vida numa grande metrópole, e diz muito sobre nós mesmo enquanto sociedade e também quanto a nossas angústias, medos e pequenas alegrias cotidianas.

O fim do Sonic Youth foi um baque para os fãs, mas vamos combinar que o vigor do quarteto havia se esvaído, provável – e aqui é pura especulação – devido ao cotidiano e ao tempo.  Mas as peripécias solos dos integrantes não tem deixado nada a desejar, na verdade nunca deixaram, pois todos os integrantes sempre tocaram seus projetos pessoais. E o respeito mútuo que nutrem pelas obras solos pode ser percebido pelo site oficial da banda, que cultiva notícias e páginas individuais de cada um deles. Ali é possível chegar um pouco mais perto da profícua obra de Lee Ranaldo. Dá um conferes:



The Idler Wheel Is Wiser Than the Driver of the Screw and Whipping Cords Will Serve You
More Than Ropes Will Ever Do - Fiona Apple

Escrevo com a mágoa do cancelamento, Fiona cancelou os shows que faria na América doSul por conta de seu cachorro, que está a beira da morte. Pra explicar isso aos fãs, escreveu a mão uma carta de 4 páginas, que entre pedidos de desculpa e explicações pela sua não vinda ao Brasil, Fiona coloca a relação que tem com seu cachorro como a mais duradoura em sua vida adulta. A partir desse breve relato temos um breve vislumbre de como é essa garota de 35 anos, que lançou estrondosamente seu primeiro disco aos 19. Em The Idler Wheel... Fiona continua um caos, expõe seus sentimentos e medos nas letras metafóricas. Mas também precisa ser uma garota muito corajosa pra escrever uma música como Jonatan, onde Fionaassume que stalka seu ex-namorado. Chega a ser violenta a forma como a garota toca piano nas canções desse álbum, soando mesmo como um instrumento de percussão, a parceria com o baterista Charley Drayton continua dando certo, e apesar dos poucos elementos sonoros, a riqueza dos arranjos e inventividade harmônica faz desse disco um dos melhores do ano. Ouvi muito esse disco, chorei algumas vezes ouvindo-o também. É um disco pra vida, nada mal pra quem ficou 7 anos sem lançar um trampo novo. Saca esse som que lindão.



Ana Mesquita é colaboradora do Pastilhas Coloridas e jornalista freelancer amante de cinema. Twitter: @anamesquitafoto
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