Repórter Elsa: a arte do contato e do malabarismo de Otavio Fantinato

Por Elsa Villon 

Quem assiste aos vídeos ou confere a página de Otavio Fantinato, não imagina que ele tem 1,90 de altura, mas a leveza de um pássaro para falar sobre as coisas. E isso já é notório em seu trabalho: malabarismo de contato. Para quem não conhece, seguem alguns vídeos aqui e aqui. Em resumo, equilibrar duas esferas com as "juntas" do corpo demanda um controle - físico e mental - deveras elevado.



Mas o Otavio faz isso parecer fácil, como se fosse parte dele mesmo e não sei vocês, mas eu sequer pisco com medo de perder as esferas de vista, como se por conta do meu olhar e não de toda a técnica e talento do malabarista elas não caíssem. O que poderia ser uma carreira artística deveras promissora - está sendo, aliás – Otavio Fantinato está muito bem, obrigado, posicionado entre as referências sul-americanas de malabarismo, mas sua aptidão também se envereda por outra vertente: as artes plásticas.

Quem vê o esbelto artista, não tem ideia do talento para os desenhos e gravuras que ele carrega sempre consigo em um caderno que alguns chamariam de surrado, mas eu chamo de sagrado. É lá, em cada folha, em cada mancha de tinta, café ou lápis de cor, que entendemos: o artista é pequeno diante da arte, mas gigante diante do cotidiano. E Otavio não é exceção - seja no malabarismo, seja com seu surrado caderno sagrado. Confira abaixo a entrevista completa, mais o nosso já conhecido "Pingue-Pongue", no qual cada entrevistado responde com o próprio trabalho a termos únicos. E tratando-se de um artista pluriapto (termo esse que ele não assume), você confere uma galeria exclusiva com um pouco mais sobre o gajo.

Qual o nome completo e a idade?

Otavio Augusto Fantinato Bordin, 31 anos.

Você é de onde - onde nasceu, onde cresceu?

Sou paulistano, mas minha primeira lembrança é estar no colo de minha vó e ver flores sobre o canal de Águas de Lindóia. Permaneci nessa cidade até os 17 anos, quando a necessidade de conhecer o mundo foi maior que o medo de romper a bolha de segurança que me envolvia. Da pequena cidade do interior
de São Paulo fui para Florianópolis e de lá pra cá posso dizer que minha casa é onde estou.

Como começou no malabarismo?

Ao chegar a Florianópolis tive de conseguir um meio pra sobreviver. Foi então que por indicações acabei indo trabalhar em um bar que mais parecia uma torre de Babel para um menino recém-saído do interior de São Paulo. No bar havia um espanhol que era garçom, um barmen chileno, um equatoriano e uma argentina na cozinha. Era administrado por um uruguaio e seu filho chamado “Leo”, nascido nas Ilhas Canárias. O Leo foi meu primeiro “mestre” e entre a produção de drinques e cafés, me ensinava os primeiros truques com três bolas e deste momento em diante fui infectado pelo malabarismo de tal forma que em questão de uma semana já afirmava que o faria pra sempre.

E a desenhar?

Desde bem pequeno já me era comum passar um tempo a mais do que as outras crianças em cima dos papéis. Mas foi por volta dos seis ou sete anos que o meu avô, Hélio Fantinato, um multiartista que considero como minha maior referencia, me ensinou as bases da perspectiva. Depois de algumas aulas ele me disse que havia me passado o que sabia daí passei a buscar outras informações na Biblioteca Municipal a qual havia muito pouco sobre arte em geral. Durante uns anos reproduzi em desenho obras clássicas de grandes mestres e algumas paisagens. Com o tempo, na metade da reprodução começava a criar em cima delas e pouco depois passei a criar minhas imagens.

Sua família te deu ou dá apoio ou batalhou uma trilha solitária para trabalhar com o que gosta?
Minha família sempre se postou de forma neutra dentro de minhas escolhas o que me facilitou em muito a desenhar meu próprio caminho. Às vezes deixar com que as coisas sigam seu rumo funciona melhor que empurrá-las em determinada direção. Sou muito grato a Dona Sônia por simplesmente deixar que o rio corresse.

Há quanto tempo trabalha com malabarismo? Como é esse nicho artístico no Brasil?

Desde que conheci “Leo”, que mudou minha vida, 12 anos se passaram. De Florianópolis segui para Monte Sião, Serra Negra e aportei em São Bernardo do Campo onde efetivamente conheci o meio profissional do circo e do malabarismo. Já haviam se passado quatro anos em que me dedicava até 10 horas por dia aos treinamentos. Foi quando meu até então professor de malabarismo, Jeisel Bonfim da Cia Diálogos Acrobáticos, me chamou para realizar um evento. Pouco depois, fiz um trabalho que perdurou por seis meses junto à outra companhia que percorreu 40 escolas periféricas da grande São Paulo realizando espetáculos e daí pra frente foram surgindo outras coisas. O Malabarismo no Brasil tem mudado muito. Quando me iniciei neste universo, eram pouquíssimas as informações disponíveis. Cheguei a demorar anos para descobrir sozinho truques que já eram feitos há 5 mil anos. Hoje, se pesquisar, a palavra juggling no Youtube terá como acabei de constatar 764.000 vídeos que lhe podem servir de referência. O nível artístico do malabarismo tem crescido, porém, de forma lenta. Uma, porque se em questões técnicas se pode construir um bom malabarista no período de um ano, para se construir um nível artístico pode se levar uma vida.

Já viajou para algum lugar por conta do trabalho? Qual? Como foi?

Por conta do malabarismo conheci muitos lugares. Com exceção das capitais do norte do Brasil, as quais ainda não tive a oportunidade de conhecer, estive no restante das capitais brasileiras e em mais dezenas ou centena de cidades. Na America do Sul, conheço a Argentina, Paraguai, Chile e Uruguai. Por meio do malabarismo ganhei histórias, amores e compartilhei em palco os mais diversos sentimentos. Recebi as mais diversas respostas. Já as artes plásticas me serviram como potencializador desses encontros. Sempre fiz questão de deixar desenhos e pinturas com os amigos que ganhava dentro destas viagens.

Dos lugares que já visitou, qual foi o mais a cidade (e país, se for o caso) mais promissora (a) para artistas - independentemente de qual arte - que encontrou?

Buenos Aires me tocou profundamente, principalmente pelo nível cultural de seus habitantes e sua forma independente no fazer arte. No Brasil, vejo que estamos muito condicionados a receber de editais para darmos vazão as nossas criações, mais ver que é possível juntar pessoas que amam o que fazem e
pensarem a arte de forma menos governamental me foi muito enriquecedor a tal ponto que saindo de lá no final de 2009 regressei ao Brasil com gana de montar meu primeiro espetáculo solo.

Há algum nome - ou alguns nomes - que te inspirem? Quem?

Sim, muitos, nas artes plásticas sempre me identifiquei com os surrealistas. Fui tocado primeiramente por uma obra chamada “The Arrival”, de um ilustrador americano chamado Cliff McReynolds, por um pôster que enfeitava a parede da casa de um amigo ainda em Águas de Lindoia. Depois, mergulhei nesse mundo
sonhado, pintado e desenhado desde os mestres que ainda nem cogitavam o manifesto até René Magritte, uma referência das minhas maiores, que não só influência dos meus desenhos, mas também meu “eu” em cena. Dentro do universo circense e teatral cito artistas que dão sentido a suas virtuoses como Leandre Ribeira e James Thiérrée, além de grupos como Acrobats, Les Apostrophes e Hugo & Ines,

Você se imagina mais no malabarismo ou mais nas artes plásticas nos próximos anos? Ou apenas prefere seguir o ritmo, sem muitas expectativas?

Se no inicio elas conflitavam dentro de mim, nos últimos anos não só vejo elas se aproximarem como se fundirem. Um exemplo: considero meu espetáculo extremamente fotográfico e essa construção existe muito por conta de meu envolvimento com artes visuais já no viés contrario a noção espacial do malabarismo e me ajuda e muito nas composições de meus desenhos e pinturas. Dependendo da minha vontade não deixarei nem meu lápis, tão pouco o palco pelo resto de minha vida. Por fim costumo dizer que as artes visuais me jogam para dentro de mim e me tornam mais introspectivo. Já as artes cênicas e o malabarismo me regatam de lá de dentro e me jogam pra cima, juntas, as duas me colocam não só em um lugar confortável, mas no lugar onde acredito que deveria estar.

Está em cartaz com algum espetáculo? Onde e qual?

Sim, com meu espetáculo solo chamado “O Descotidiano”, que é uma junção de cenas curtas e envolvem manipulação de objetos do cotidiano somados ao malabarismo, com objetos clássicos e a utilização de aparelhos criados por mim. É um trabalho ao qual tenho dedicado meus últimos três anos e vem se metamorfoseando no decorrer do tempo. Enfim, é um espetáculo qu acredito apresentar por muitos e muitos anos. Quanto às datas específicas, estão disponíveis na agenda da página no Facebook ou o próprio Blog da Companhia do Relativo.

Tem previsões de expor seus desenhos e gravuras?

No segundo semestre devo realizar minha primeira exposição individual, mas ainda requer confirmação. Tenho muita vontade de abranger o acesso ao meu trabalho visual, porém isso é algo que não tenho pressa.

A internet tem te ajudado a conseguir ingressar nessa área, que até pouco tempo era bem restritiva e considerada "erudita"?

Posso dizer por hora que a internet tem me ajudado e muito com a facilitação do acesso a meus desenhos e pinturas, o que me faz muito feliz. Embora tenha meu trabalho como malabarista amplamente difundido, como artista plástico foi apenas em janeiro deste ano que passei da divulgação pessoal para o livre acesso
na rede de boa parte do que produzi nos últimos 10 anos. Mas acredito e tenho investido meu tempo e energia nessa forma de exposição, vejo que começam a aparecer os primeiros frutos como encomenda de trabalhos e essa matéria por exemplo.

E como já é tradição, agora começa a parte da entrevista Pingue-Pongue: por meio de seus trabalhos, Otavio diz o que cada termo representa:·.

- Artes.


- Malabarismo.


- Família.


- Circo.


- Infância.


- Café.


- Amor.


- 2013.


Confira a galeria de fotos...














Elsa Villon é colaboradora do Pastilhas Coloridas, jornalista e fotógrafa viciada em café, cinéfila, adora Beatles e cheiro de pão saindo do forno. Twitter: @elsavillon
Share: