Moviola - Esta noite encarnarei no teu cadáver


Por Marcelo Mendez | Cinema | 

E como diria o grande Gonzagão, “Ó eu aqui de novo xaxando, ó eu aqui de novo para xaxar”...

Volto ao Pastilhas pra tratar de uma das maiores paixões da minha vida, o Cinema. E então vamos começar com uma história antiga... mas bem antiga.

Passa pelo Parque Novo Oratório do final dos anos 70, aproximadamente 1977, com certeza inverno daquele ano porque disso me lembro. Eu tinha 7 anos e minha mãe me empacotava de blusas para irmos as sessões de terror no Circo que havia se instalado no “larguinho”, hoje, uma praça entre as Ruas Cáucaso e Corrientes, cá em Santo André.

No Circo, um tal Zé Do Caixão era a atração mais do que principal. Afinal de contas o dono do circo falava em um “astro do cinema”, “um homem que até na TV aparecia”. Na inocência da minha tenra idade não dei nenhuma importância pra isso, mas me lembro que fiquei umas boas noites encabreirado com aquele homem de preto e suas unhas enormes.

Passou alguns bons anos para eu saber que aquele homem era um dos principais nomes do cinema brazuca e mal sabia eu que ele me influenciaria tanto. Então pra prestar uma homenagem para um dos responsáveis por esse meu amor todo pela sétima arte...

Senhoras e senhores, moças sérias e aquelas outras mais “generosas”, homens sérios e cabras desavergonhados, comedores do contra filet e apreciadores da rúcula, Com vocês JOSÉ MOJICA MARINS e seu seminal ESTA NOITE ENCARNAREI TEU CADÁVER.

Lembro de um otário que descobriu Buñuel e Dali em 2000 e certa vez me disse... “Não consigo entender a mensagem cifrada de FANTASMA DA LIBERDADE” Que bom! Assim poupa o Buñuel e o mundo do achismão culturete. Nem nunca entenderá porra nenhuma. O bobão vai procurar na Espanha, o que poderia encontrar no Brás! Quer falar da Cineccita sem saber da louca e frenética Sinagoga do Mojica. Pois é...

No final dos anos 60, 1967 era o ano, Zé Mojica mantinha uma sinagoga abandonada no Brás, onde rodava seus filmes. De lá saíram clássicos como A MEIA NOITE LEVAREI SUA ALMA, RITUAL DE SÁDICOS e este nosso ESTA NOITE ENCARNAREI TEU CADÁVER. Falei do surrealismo dos mestres porque a sinagoga do Mojica colocaria no bolso, qualquer teórica manifestação nesse sentido. Ali acontecia de tudo!

Tanto poderia ser visto o Glauber Rocha ou o Luis Sérgio Person, como um ou outro freak comendo barata, caçando aranhas alugadas... Tinha tudo e tem de tudo no cinema do Zé... E de qual Zé falamos?

Bom... Eu começo falando do Mojica; É como falei um dos maiores nomes do cinema nacional por tudo. Um homem simples, que veio do povo, semiletrado, que tem uma lista de admiradores tais como Carlos Reichenbach, Luis Sérgio Person, Ivan Cardoso. Era Diretor, montador, editor e literalmente o diabo nos seus filmes... E o Zé do Caixão?

Há quem diga (Com razão) que uma série de equívocos de Mojica, fez com esse personagem engolisse o grande diretor que ele é. Fato é que, um grande personagem a ponto de ter esse poder todo, só pode ser uma grande criação e ela, é obra do Mojica. Portanto, a grandiosidade do cara não some, certo? Bem... em ESTA NOITE... a coisa pode ser comprovada...

A onda toda, gera em torno da busca do Zé do Caixão assessorado pelo fiel criado Bruno, atrás pelo filho perfeito. Então raptam seis moças submetendo as desgraçadas a uma série de torturas. O lance seria esperar por uma que resistisse a essa desgraceira toda. A “vitoriosa” seria então a escolhida pra gerar um filho de Zé Do Caixão. No meio da barbárie, Zé do Caixão assassina uma mulher grávida e vai parar num inferno gelado. E essa é uma das mais espetaculares cenas que o cinema brazuca já produziu...

São 12 minutos de catarse, em cores, efeitos especiais feitos sem um puto, com muita fumaça, cola, lama, gelo seco, bigato de goiaba e a caralhada a quatro. Resultado espetacular explodindo na tela no reencontro de Zé Do Caixão e suas vitimas.

Esta noite... é o filme mais popular de Mojica, Um dos mais premiados, mais reconhecidos fora do Pais e mais turbulentos. Rolou de tudo durante as filmagens... Morte de um membro da equipe técnica após uma noite de porre homérico, censores furiosos após assistir o personagem Zé Do Caixão afirmar sua descrença em Deus afogando um padre num lago de águas pestilentas, as dividas todas...

É ótimo ver a reverencia com que mojica é tratado hoje em dia mas é bem verdade que eu não gostaria de ter que passar por metade dos problemas que ele enfrentou. Então pra acabar a falação, MOVIOLA estreia aqui trazendo pra vocês essa preciosidade. Só dar play e perigas ver.



Marcelo Mendez é colaborador do Pastilhas Coloridas, filho da Dona Claudete, escritor e um dos responsáveis pelo cineblog Bandidos do Cine Xangai.
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